terça-feira, 12 de abril de 2011

‘Nordestino da gema’, Araújo dribla começo difícil para vencer no Rio

Calça jeans, camisa preta e olhar deslumbrado para a praia em uma tarde em que os termômetros chegaram a apontar 35º no Rio de Janeiro. Quem passava pelo calçadão da Barra da Tijuca não tinha dúvidas em apontar: era turista. E era mesmo. Mas um “turista” que pretende ficar um bom tempo na Cidade Maravilhosa. Depois de rodar pela Ásia e pelo Oriente Médio por cinco anos, Araújo está de volta ao Brasil e quer fazer do Rio mais uma parada bem sucedida antes de voltar definitivamente para seu porto seguro: Caruaru (PE).
Araujo Fluminense (Foto: Cahê Mota / Globoesporte.com)
Contratado com salário digno dos galácticos do elenco, o atacante chegou ao Fluminense prestigiado pela diretoria, mas não muito por Muricy Ramalho. Ao receber o “presente” que não pediu, o treinador não demonstrou entusiasmo e as oportunidades foram poucas.
- Ficou um negócio meio sem explicação. Por que eu tinha que só treinar para me adaptar? De repente pode ter sido por eu não ter sido indicado. Enfim, bola para frente.
Bola para frente. Bola para o gol. As dúvidas permaneceram, mas Muricy não. E a realidade de Araújo é outra. Se a camisa de titular ainda pertence a Emerson, as chances agora são mais constantes. Como na goleada por 5 a 1 diante do Americano, domingo, em Macaé, quando marcou dois gols.
Se no mundo da bola as coisas se transformam rapidamente, fora do campo nada foi capaz de mudar Araújo. Nordestino com orgulho, sim, senhor, ele mantém o sotaque carregado, ouve forró e come cuscuz semanalmente. Nada disso, porém, o faz fechar as portas para o mundo que se abre no Rio. Depois de experimentar iguarias como carne de baleia no Japão e língua de carneiro no Qatar, o pernambucano tem desfrutado dos prazeres cariocas.
Em bate-papo com o GLOBOESPORTE.COM, Araújo admitiu os problemas iniciais, demonstrou confiança em um futuro vitorioso, considerou aberta a disputa com Emerson e falou da sua rotina nordestina em terras cariocas:
- Aqui o pessoal usa menos roupa, né? (risos).
Confira a entrevista completa:
Apesar de ter chegado como contratação desejada pelo clube há dois anos, você não tem tido tantas chances. Qual foi a importância desses dois gols contra o Americano?
Araujo Fluminense (Foto: Cahê Mota / Globoesporte.com)Araújo admitiu dificuldades ao chegar no Flu
(Foto: Cahê Mota / Globoesporte.com)
Fico muito mais confiante. As oportunidades têm aparecido e tenho mostrado que posso ajudar. E sei que posso fazer muito mais.  Não só pelo dois gols, mas por ter tido uma boa exibição, essa partida foi importante para o restante da temporada.
Os gols foram importantes, mas o Emerson, que cumpriu suspensão contra o Americano, volta a ficar à disposição para o jogo diante do Nova Iguaçu. A vaga está em aberto ou ele é o titular?
Vamos esperar o que vai acontecer durante a semana. Estou trabalhando para buscar o meu espaço. Quem vai decidir é o Enderson. Me mantenho tranquilo. Sei que fiz uma boa partida, fiz gols, e as coisas vão acontecer naturalmente.
Fala-se muito em estrelas como Deco, Conca, Fred, Emerson, mas você era um sonho antigo do Fluminense. Ainda assim,  chegou na obrigação de ter que provar mais uma vez seu valor, sem tanto prestígio. Como encara essa situação, de ter que praticamente começar do zero já com 33 anos?
Realmente foi difícil no começo. Isso é novo para mim. Já mostrei muita coisa pelos lugares onde passei e esse é mais um desafio. Ao longo desses dois meses que estou no clube, pensei muito. Alguns momentos foram complicados, mas sei da minha capacidade. Mostrei isso contra o América do México, contra o Americano... Estou investindo em mim mesmo. Trabalho para dar cada vez mais. Sei como é o futebol. Às vezes começa difícil e depois tudo clareia.
Em algum momento se arrependeu de trocar um país onde era tratado como “rei” para ser visto como apenas mais um no Flu?
O choque quando eu cheguei foi grande. Senti dificuldades. Não pela questão do tratamento, da vaidade. Nunca liguei para isso, não. Não me preocupo com fama, essas coisas. Mas ligo, sim, para sempre estar jogando, conquistando títulos, buscando objetivos pessoais. Isso que me preocupava, me afetava. Não tive oportunidades e fiquei um pouco abatido. Só em campo podia mostrar meu potencial. Sem jogar, era complicado. Graças a Deus as coisas estão mudando. Tenho a minha história, não preciso provar nada para ninguém, só ratificar tudo que já fiz. É mais uma etapa na minha carreira que vou passar por cima.
No começo do ano, você e o Muricy deram declarações contrastantes. Ele disse que você não estava em forma, enquanto você se dizia pronto. Acredita que por não ter sido uma indicação dele, como os outros reforços, o treinador teve má vontade com você?
Ficou um negócio meio sem explicação. Falam que eu estava no Qatar, mas Thiago Neves estava na Arábia e voltou jogando. Por que eu tinha que só treinar para me adaptar? De repente pode ter sido por eu não ter sido indicado
Ficou um negócio meio sem explicação. Aceitei a opinião dele, mas quando falei que já estava bem era como me sentia. Eu precisava jogar, pegar ritmo. Não adianta só treinar. Em treino você não ganha nada. Falam que eu estava no Qatar, mas Thiago Neves estava na Arábia e voltou jogando, Felipe, que veio do Qatar, também. Por que eu tinha que só treinar para me adaptar? Vejo desta maneira. Ainda assim, respeitei a posição do Muricy. Nunca tive atrito com ele. Acho que a entrevista acabou atrapalhando um pouco, ele pode ter pensado que eu falei demais. Só que é algo normal. De repente pode ter sido por eu não ter sido indicado. Enfim, ficou sem explicação, mas faz parte do futebol. Bola para frente.
Araujo Fluminense (Foto: Cahê Mota / Globoesporte.com)
Você é um cara simples, tranquilo, e que faz questão de se mostrar um típico nordestino até mesmo nos hábitos. Como tem encarado essa fase carioca?
É uma nova experiência. Já passei por várias culturas diferentes, e essa é mais uma. É algo que me dá ainda mais motivação. O desafio. Quero fazer história no Fluminense. É estranho mesmo viver em um lugar diferente. Sou muito ligado à minha terra, venho de família simples, nunca liguei para vaidade. É algo meu. Sou o mesmo Araújo desde pequeno. Então, aqui minha preocupação é só jogar. É um dom que eu tenho e me deu tudo. Quando pequeno, estudava por conta do futebol de salão, ganhava bolsa nas escolas. É isso que me dá alegria e me faz encarar de frente esse desafio. Mantenho minha simplicidade, humildade, respeito.
Já se acostumou depois de anos no Qatar?
O Rio é maravilhoso. Estou gostando muito. Principalmente por viver em frente à praia. Minha família adora, ainda mais pelo tempo que vivemos fora. Está sendo importante para meus filhos. Eles vivem mais soltos, vão ao colégio, curtem a praia... Em todos esses sentidos, tem sido muito bom. Optei por vir para o Fluminense muito por isso. Além de voltar a jogar o Brasileiro, a Libertadores. Estou muito feliz. Para ficar 100%, só quero dar mais alegrias aos torcedores.
Já conheceu bem a cidade?
Sempre que dá eu vou à praia com meus meninos, brinco com eles, aproveito o condomínio. Aqui também tem muita opção de restaurantes. Procuro aproveitar tudo.
Você mora em frente a um ponto conhecido por ter muitos surfistas. Se arriscar a pegar uma onda também ou não é muito a sua?
Não, não (risos). Eu sou mais da areia. Não curto muito essas aventuras. Sou mais quieto. O mar não é para mim. Gosto de olhar, de ver.
E qual a principal diferença do carioca para o pernambucano? Já conseguiu identificar?
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Aqui no Rio as pessoas usam menos roupa, né? (risos). Para você ver, eu estou aqui na praia de calça. O povo carioca é mais aberto. É legal conviver com essa mentalidade. Faz crescer"
São culturas diferentes, personalidade, jeito. Mas não há tanta diferença. Acho que o fato de o pessoal conviver na beira da praia, mais tranquilo, faz com que sejam mais relaxados. O principal para mim é que aqui no Rio as pessoas usam menos roupa, né? (risos). Para você ver, eu estou aqui na praia de calça (riso). Nós somos mais reservados. O povo carioca é mais aberto. É legal conviver com essa mentalidade. Faz crescer. É importante observar todas as culturas. Já morei no Qatar, no Japão... Aqui tem sido mais um aprendizado.
Em casa, porém, você busca manter a sua Caruaru? Se preocupa em comer comidas típicas, ouvir músicas da terra...
Eu já comi de tudo pelo mundo. Comi golfinho, baleia, aquelas carnes coreanas que nem sei se são de cachorro... Lá no Qatar comia cérebro, língua de carneiro. Então, procuro variar. Mas em casa tem que ter o meu arroz, feijão, cuscuz, as coisas típicas da minha terra.
No som já rola um funk ou mantém o forró?
Aí, não tem como fugir. Prefiro um forrózinho mesmo. O funk não me agrada. Com o forró eu lembro da minha cultura, minha terra, minhas raízes.
 

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